Parecer nº 1.437/2010 (DOC de 02/12/2010, página 98)

Dispõe sobre a implantação de pontos de entrega voluntária de medicamentos vencidos e institui a política de informação sobre os riscos ambientais causados pelo descarte incorreto desses produtos, considerados resíduos domiciliares tóxicos no município de São Paulo. 

Da Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa Sobre o Projeto de Lei nº 0272/10. 

Trata-se de projeto de lei de autoria do nobre vereador Cláudio Fonseca, que dispõe sobre a implantação de pontos de entrega voluntária de medicamentos vencidos e institui a política de informação sobre os riscos ambientais causados pelo descarte incorreto desses produtos, considerados resíduos domiciliares tóxicos, no Município de São Paulo.

A propositura em apreço determina, ainda, que a divulgação dos locais para recebimento dos medicamentos vencidos e as informações sobre os riscos causados pelo descarte incorreto desses produtos serão efetivadas através de campanhas publicitárias para esclarecimento e conscientização sobre o risco causado ao meio ambiente pelo descarte incorreto de medicamentos vencidos.

Fixa, por fim, que compete ao poder Executivo, por meio de órgão competente, a responsabilidade pelo recolhimento e destinação final dos medicamentos vencidos coletados em cada ponto implantado para esse fim.

Na forma como se encontra redigido o projeto, ele não reúne condições de prosseguimento porque impõe ao Executivo a prática de atos concretos de administração, vez que fica sob sua responsabilidade o recolhimento e a destinação final dos medicamentos vencidos coletados (art. 3º), violando assim, a competência do Prefeito para, nos termos do art. 70, inciso XIV, da Lei Orgânica do Município, dispor sobre a organização e funcionamento da administração.

Não obstante, na forma do Substitutivo ao final proposto com a concordância do autor do projeto, ele reúne condições para prosseguir em tramitação porque atribui às farmácias e drogarias a instalação dos pontos de coleta para o recebimento dos medicamentos vencidos.

Encontra fundamento assim na competência concorrente da União, Estados, Distrito Federal e também dos Municípios para legislar sobre proteção e defesa do meio ambiente (arts. 24, inciso VI c/c 30, I e II, da CF).

Há que se observar ainda que, sobre a matéria a Diretoria Colegiada da Anvisa expediu a Resolução RDC nº 44, de 17 de agosto de 2009, que em seu artigo 93, já permite que esses estabelecimentos participem do programa de coleta de medicamentos a serem descartados pela comunidade.

Por outro lado, a atribuição da obrigatoriedade das drogarias e farmácias instalarem pontos de coleta de medicamentos vencidos encontra consonância também com o princípio da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos (art. 30, Lei Federal 12.305/10), princípio do poluidor pagador e princípio do desenvolvimento sustentável, cumprindo ressaltar ainda que, nos termos do art. 170, inciso VI, da Constituição Federal, a atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente.

Com efeito, a tônica do princípio do poluidor pagador é a transferência do ônus que a coletividade suporta em razão do consumo de certos produtos para aqueles que auferem o lucro da produção. Nas palavras de Terence Dornelles Trennepohl (in “Direito Ambiental”, 3ª edição, 2008, Editora JusPodivm, pág. 53): “Busca-se compensar a degradação (chamada por alguns doutrinadores de ‘externalidades negativas’) haja vista o dano ser coletivo e o lucro recebido pelo produtor privado. É uma forma de compensar essa capitalização do lucro e a socialização do dano.”O princípio do desenvolvimento sustentável, por sua vez, visa, como o próprio nome sugere, aliar o desenvolvimento, o progresso, a um padrão mínimo de condições necessárias à sadia qualidade de vida.

Invocamos novamente as considerações do autor citado linhas atrás (pág. 55): “O desenvolvimento sustentável é aquele que busca atender aos anseios do presente, tentando não comprometer a capacidade e o meio ambiente das gerações futuras. Não se trata de um estado permanente de harmonia, mas um processo de mudança no qual a exploração dos recursos, a orientação dos investimentos, os rumos do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional estão de acordo com as necessidades atuais e futuras.”

Corroborando o acima exposto, tem-se o posicionamento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, espelhados nos arestos abaixo reproduzidos à guisa de exemplo: “A atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente. A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral.” (STF - ADIn nº 3.540-MC, julg. Em 01/09/05, grifamos)

“O sistema jurídico de proteção ao meio ambiente, disciplinado em normas constitucionais (CF, art. 225, § 3º) e infraconstitucionais (Lei nº 6.938/81, arts. 2º e 4º), está fundado, entre outros, nos princípios da prevenção, do poluidor-pagador, e da reparação integral. Deles decorrem, para os destinatários (Estado e comunidade), deveres e obrigações de variada natureza, comportando prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), bem como de pagar quantia (indenização dos danos insuscetíveis de recomposição in natura), prestações essas que não se excluem, mas, pelo contrário, se cumulam, se for o caso.” (STJ - REsp. 605.323, julg. 18/08/05, grifamos)

Cumpre observar ainda que a manutenção de um meio ambiente saudável e equilibrado é assunto que é de interesse de todos vez que é imperioso à sobrevivência humana e à sadia qualidade de vida, e foi alçado à categoria de princípio constitucional impositivo quando a Constituição Federal determinou ao Poder Público em todas as suas esferas, Federal, Estadual e Municipal (artigos 225 e 23, inciso VI), o poder-dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.

Atenta a tal panorama, a Lei Orgânica do Município de São Paulo também prevê o poder-dever do Município de zelar pelo meio ambiente nos seguintes termos:

“Art. 7º É dever do Poder Municipal, em cooperação com a União, o Estado e com outros Municípios, assegurar a todos o exercício dos direitos individuais, coletivos, difusos e sociais estabelecidos pela Constituição da República e pela Constituição Estadual, e daqueles inerentes às condições de vida na cidade, inseridos nas competências municipais específicas, em especial no que respeita a: I – meio ambiente humanizado, sadio e ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo, para as presentes e futuras gerações;”

Já no Art. 181 da Lei Maior Local vislumbra-se a diretriz traçada ao Poder Público para que elabore uma política de cunho participativo de proteção ao meio ambiente: Art. 181 - O Município, mediante lei, organizará, assegurada a participação da sociedade, sistema de administração da qualidade ambiental, proteção, controle e desenvolvimento do meio ambiente e uso adequado dos recursos naturais, para coordenar, fiscalizar e integrar as ações de órgãos e entidades da administração pública direta e indireta, no que respeita a:

I - formulação de política municipal de proteção ao meio ambiente.

Por fim, cumpre observar que não se trata de indevida interferência estatal na atividade econômica privada porque a Constituição Federal, em seu art. 170, inciso VI, ao lado da consagração do princípio da livre iniciativa (artigos 1º, inciso IV e 170), elegeu a defesa do meio ambiente como um dos limites a serem observados no desenvolvimento de atividades econômicas.

Por outro lado, a propositura denota típica manifestação do poder de polícia do Município, mais precisamente na modalidade de polícia das atividades urbanas em geral. Oportunas, neste ponto, as lições de Hely Lopes Meirelles (In “Direito Municipal Brasileiro”, 16ª edição, Malheiros Editores, 2008, p. 516): “Tal poder é inerente ao Município para a ordenação da vida urbana, nas suas exigências de segurança, higiene, sossego e bem-estar da coletividade. Por isso, a jurisprudência tem consagrado reiteradamente a validade de tal regulamentação e das respectivas sanções como legítima expressão do interesse local.” (grifamos)

É manifesto, pois, o interesse público a ser tutelado sob o fundamento do latente interesse local combinado com o poder de polícia do Estado.

Por se tratar de matéria sujeita ao quorum de maioria simples para deliberação, é dispensada a votação em Plenário, cabendo tal prerrogativa às Comissões Permanentes, na forma do art. 46, X, do Regimento Interno desta Casa.

Destaque-se, ainda, que estando o projeto em análise relacionado com a política municipal de meio ambiente é necessária a realização de duas audiências públicas, nos termos do art. 41, VIII, da Lei Orgânica do Município.

Ante o exposto, na forma do substitutivo que segue, somos pela CONSTITUCIONALIDADE e LEGALIDADE.

SUBSTITUTIVO Nº

DA COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E LEGISLAÇÃO PARTICIPATIVA AO PROJETO DE LEI Nº 272/10.

Dispõe sobre a implantação de pontos de entrega voluntária de medicamentos vencidos, determina a afixação de placa informativa sobre os riscos ambientais causados pelo descarte incorreto desses produtos, e dá outras providências.

A Câmara Municipal de São Paulo D E C R E T A:

Art. 1º As drogarias e farmácias ficam obrigadas a instalar pontos de entrega voluntária de medicamentos vencidos, bem como a afixar, junto ao caixa do estabelecimento, em local visível ao público, placa informando sobre os riscos ambientais do descarte incorreto de medicamentos vencidos esclarecendo, ainda, que o referido estabelecimento é um ponto de coleta desses produtos.

Art. 2º O descumprimento do disposto nesta Lei acarretará a aplicação de multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), dobrada na reincidência.

Parágrafo único. O valor da multa deverá ser reajustado anualmente pela variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), acumulada no exercício anterior, e, no caso da extinção deste índice, será adotado outro criado por legislação federal que reflita a perda do poder aquisitivo da moeda.

Art. 3º O Poder Executivo regulamentará a presente lei no prazo de 60 (sessenta) dias, contados da data de sua publicação.

Art. 4º As despesas decorrentes da execução desta lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.

Art. 5º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Sala da Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa, em 01/12/2010.

Ítalo Cardoso – PT – presidente
Abou Anni – PV – relator
Agnaldo Timóteo – PR
Celso Jatene – PTB
Floriano Pesaro – PSDB
Gabriel Chalita – PSB
João Antonio – PT
Kamia – DEM

 

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