30/09/2006 – Seminário: Educar brincando e brincar educando

Palestrante: Telma Vitória

A brincadeira é uma atividade da natureza humana presente em todas as fases da vida. Ela representa uma ferramenta, ou um recurso para o nosso desenvolvimento. Através dela, em ambientes coletivos, a criança aprende e desenvolve muitas coisas, como por exemplo: orientação e organização espacial; adequação de movimentos apropriados à situação; habilidades necessárias para o manuseio de diferentes objetos; representação de imagens e conteúdos relacionados a situações já vividas ou presenciadas – memória –; projeção e planejamento sobre ações seqüenciais; diferentes linguagens; negociação de suas idéias e interesses junto às outras crianças envolvidas na brincadeira; compreensão das intenções dessas crianças; soluções para os conflitos que ocorrem nessas interações; regras de conduta social presentes em sua cultura; elaboração de emoções e sentimentos.

Ao assumir diferentes papéis ou posições na brincadeira ela exercita o “ser” de diferentes formas, o que contribui para a construção da sua identidade, desenvolve seu jeito próprio de agir sobre o mundo, permite que ela sinta como é se colocar no lugar do outro e que faça escolhas de reação perante as situações que vive dentro e, depois, fora da brincadeira. Com isso tudo, a brincadeira amplia a sua visão do mundo e de si mesma com experiências que podem ser levadas para o resto da vida. Quem não tem memória de brincadeiras vividas em sua pauta de infância? Só quem não teve oportunidade de brincar.

Portanto, através da brincadeira pode-se observar o desenvolvimento ocorrendo de maneira global e integrada, pois envolve os aspectos físicos, psicológicos (cognitivos e emocionais) e sociais ou culturais simultaneamente.

Por isso, embora se possa dizer que a brincadeira é uma atividade espontânea, a escolha sobre o quê e como brincar é aprendida, conforme os recursos, as regras, as práticas, os valores e as crenças do grupo social (e histórico) no qual as crianças estão inseridas.

Atualmente os centros de educação infantil são os únicos espaços para muitas crianças brincarem, tal como outras gerações já o fizeram na rua. Visto a grande importância dessa atividade no desenvolvimento, é necessário que dediquemos especial atenção a ela. No entanto, a brincadeira não está garantida nos planejamentos pedagógicos de muitas creches e pré-escolas brasileiras, devido a vários fatores, dentre eles, a tendência à escolarização precoce, à não constituição de uma cultura de valorização da mesma entre os professores e a dificuldades institucionais de organização do espaço e da rotina para propiciá-la.

Constatamos isso quando, por exemplo, só observamos as brincadeiras ocorrerem nos momentos de “atividade livre”, ou de recreio, quando professores acreditam que sua única função é “ficar olhando” e atuando em momentos de conflito. Outras instituições fazem uso do jogo e da brincadeira como recurso didático, para permitir que as crianças descarreguem sua energia, como instrumento de sedução ou negociação.

É certo, como já exposto, que jogos e brincadeiras se aprende. Portanto, é necessário que alguém ensine as crianças a brincar. Por outro lado, a atividade lúdica é voltada para o prazer, além da aprendizagem. Envolve a capacidade de gozar a vida e a imaginação.

Aliás, a imaginação e a criatividade são outras importantes características humanas desenvolvidas através das brincadeiras. Pois é nelas que aprendemos a dar liberdade à mente. Desde muito cedo as crianças aprendem a diferenciar as situações “sérias” das lúdicas e aprendem que nestas últimas têm maior liberdade para imaginar e criar.

Os jogos e brincadeiras são espaços de aprendizagem, porém, incertos quanto aos resultados em sua finalização. Por isso, não é possível o professor planejar exatamente quais conteúdos poderão ser ensinados através deles. Porém mais importante do que o ensino de conteúdos nessa fase da vida é criar possibilidades para que as crianças construam sua cultura infantil.

A partir de objetivos amplos, o professor que valoriza a brincadeira como atividade importante para as crianças pode planejar os espaços e tempos a partir delas, criando situações e propostas que envolvam pequenos grupos para brincar conforme seus interesses e atuar brincando junto, ajudar a organizar, ou mesmo somente observar o que ocorre para planejar novas situações.

É desta maneira que acreditamos estar de acordo com o que a professora Zilma Oliveira afirma a seguir:

A definição de uma proposta pedagógica para a creche ou pré-escola deve considerar a atividade educativa como ação intencional orientada para a ampliação do universo cultural das crianças, de modo que lhes sejam dadas condições para compreender os fatos e os eventos da realidade, habilitando-as a agir sobre ela de modo transformador. (Oliveira, 2002)

BROUGÉRE, Gilles Brinquedo e Cultura. Ed. Cortez, São Paulo, 1994.

FARIA, Ana Lúcia G. de Educação Pré-Escolar e Cultura, Ed. Cortez, São Paulo, 1999.

GALVÃO, Isabel Henri Wallon – Uma concepção dialética do desenvolvimento infantil, Ed. Vozes, Petrópolis, 1995.

OLIVEIRA, Zilma R. de Educação Infantil – Fundamentos e métodos, Ed. Cortez, São Paulo, 2002.

 

 

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